Suprema Corte dos EUA autoriza Trump a revogar visto de mais de 500 mil imigrantes
Decisão aprovada por maioria conservadora permite que o presidente revogue proteção a estrangeiros de países em situação de vulnerabilidade humanitária.
POLÍTICA
Manoela Becker Berto
6/7/20254 min ler


A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu, em 30 de maio de 2025, por maioria de votos, autorizar o presidente Donald Trump a revogar o status de proteção temporária (TPS) de mais de 500 mil imigrantes. A decisão judicial, com forte peso político e social, representa um novo capítulo na histórica disputa entre segurança nacional e acolhimento humanitário no país.
Criado em 1990, o Temporary Protected Status é um instrumento do governo norteamericano que concede residência e autorização de trabalho a estrangeiros provenientes de países afetados por crises humanitárias graves, como conflitos armados, desastres naturais ou instabilidade política severa. O programa já foi utilizado para proteger cidadãos de mais de 20 países, entre eles El Salvador, Haiti, Venezuela, Síria e Ucrânia, oferecendo-lhes a possibilidade de permanecer nos EUA enquanto a situação em seus países de origem se normaliza.
Com o novo entendimento da Suprema Corte, o Executivo adquire autonomia para cancelar unilateralmente essas proteções, mesmo para indivíduos que vivem legalmente no país há décadas. Entre os imigrantes afetados estão centenas de milhares de latinoamericanos que construíram vida nos Estados Unidos, formaram famílias, pagam impostos e contribuem diretamente para a economia local.
Segundo dados do Migration Policy Institute, aproximadamente 270 mil filhos de beneficiários do TPS são cidadãos norte-americanos por nascimento. Isso significa que, se os pais forem deportados, muitas dessas crianças enfrentarão o dilema de deixar seu país natal ou permanecer sob custódia de familiares ou do Estado.
O voto da maioria conservadora da Corte baseou-se na interpretação de que o TPS não pode ser convertido em um benefício permanente. O relator do caso, juiz Samuel Alito, escreveu que “as condições que justificam a proteção temporária são voláteis, e a responsabilidade de decidir sua duração recai sobre o Poder Executivo, não sobre os tribunais”. A decisão reverte interpretações anteriores de cortes inferiores, que viam a revogação em massa como uma violação do devido processo legal e dos princípios de proporcionalidade.
O presidente Trump, que há anos critica o que considera “excessos da imigração legal e ilegal”, celebrou a decisão como “uma vitória para a soberania dos Estados Unidos”. Em discurso na Casa Branca, ele declarou que “políticas temporárias não devem se tornar permanentes por comodidade política” e que “a América precisa retomar o controle de suas fronteiras com firmeza e justiça”.
A repercussão foi imediata. Organizações como a American Civil Liberties Union (ACLU), a National Immigration Law Center e a Human Rights Watch condenaram a decisão e alertaram para o risco de um colapso social em várias comunidades nos EUA. “Estamos falando de pessoas que vivem aqui há mais de vinte anos. Muitos são enfermeiros, professores, cuidadores, motoristas, pais de crianças americanas. Desmantelar essas comunidades de forma abrupta é inaceitável”, disse Karen Tumlin, diretora do Justice Action Center.
Além do impacto interno, a medida causou tensão diplomática. Governos da América Central, em especial os de El Salvador, Honduras e Nicarágua, expressaram preocupação com o possível retorno em massa de seus cidadãos, sem planejamento e sem estrutura para acolhê-los. O presidente de El Salvador, em nota oficial, solicitou uma reunião bilateral com representantes dos EUA para discutir alternativas humanitárias. Já a Organização dos Estados Americanos (OEA) afirmou que a decisão “coloca em risco direitos fundamentais de milhares de latino-americanos que viveram legalmente sob um sistema institucional”.
Analistas de política externa apontam que a decisão pode provocar um efeito dominó na região. A deportação em larga escala tende a pressionar os frágeis sistemas econômicos e sociais dos países emissores, estimular novos fluxos migratórios irregulares e sobrecarregar fronteiras, especialmente a do México. Clara Long, especialista em direitos humanos da Human Rights Watch, afirmou à CNN que “a retirada de proteção para centenas de milhares de pessoas não resolverá a crise migratória; ao contrário, pode agravá-la”.
Dentro dos EUA, manifestações contrárias à decisão ganharam força em centros urbanos como Nova York, Los Angeles, San Francisco e Chicago. Líderes religiosos, prefeitos e parlamentares democratas classificaram a medida como uma violação aos princípios de dignidade e respeito que, historicamente, fundamentaram a identidade americana como nação de imigrantes. Em diversas escolas públicas, estudantes protestaram em solidariedade a colegas cujos pais estão sob risco de deportação.
Em meio à comoção, cresce a pressão sobre o Congresso para discutir uma reforma migratória definitiva que ofereça uma solução jurídica para imigrantes que, apesar de sua condição “temporária”, já estão integrados à sociedade norte-americana. Diversos senadores e deputados retomaram projetos de regularização que, nos últimos anos, ficaram estagnados por falta de consenso bipartidário.
A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos não apenas altera o destino de mais de meio milhão de pessoas, como também redefine os limites da proteção humanitária dentro da maior potência global. Com repercussões que ultrapassam fronteiras, a medida coloca em xeque o equilíbrio entre soberania estatal e responsabilidade internacional, desafiando os Estados Unidos, e o mundo a repensarem o futuro das políticas migratórias em um cenário global de deslocamentos cada vez mais intensos e complexos.